domingo, 29 de janeiro de 2012

cigarros Nazir

Após a morte de meu avô, ao esquadrinhar o seu quarto-maravilha, espécie de bric-à-brac científico-artístico, encontrei um maço intacto de cigarros Nazir e uma boquilha de cerejeira. Embolsei o tesouro.
Na Primavera, encontro-me uma manhã em Maisons-Laffitte, entre ervas altas e cravos selvagens, abrindo o maço e fumando um dos cigarros. A sensação de liberdade, de luxo, de futuro, foi tão forte, que nunca, aconteça o que acontecer, nunca sentirei nada de análogo. Poderão nomear-me rei ou guilhotinar-me: a surpresa, a estranheza, não seriam mais intensas do que esta entrada interdita no universo das pessoas grandes; universo de lutos e amargura.
Uma coisa ainda me encanta, me transporta instantaneamente à infância: a tempestade. Mal ela ribomba, mal ela solta a sua vasta claridade malva, inunda-me uma doçura, uma calma. Eu detestava tanto a nossa casa de campo, vazia, uns e outros partindo (para ocupações fora), como detesto que leiam o jornal defronte de mim. A tempestade assegurava-me uma casa cheia, lume, jogos, um dia íntimo e sem desertores. Sem dúvida é esta a antiga sensação de intimidade que comanda esta alegria logo que escuto a tempestade.


(tradução de Maria Teresa Horta)
in Ópio, Ulisseia

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