Trouxeste-me aqui para acabar tudo,
numa terça-feira irrespirável. A destilaria de uma tempestade,
os pombos lustrosos da chuva.
O meu guarda-chuva preto flectia as varetas.
Pele encharcada, fiz o caminho até à multidão
dos bares, onde casais passam entre si
comprimidos brancos de língua para língua, leves como chuva
miudinha, os teus dedos pelo meu cabelo,
como quando quase me passavas
qualquer coisa ao sangue.
Na clínica, perguntaram se eu tinha tatuagens,
e eu lembrei-me outra vez deste lugar –
a icterícia das paredes, o tricô lamuriento
da agulha sobre o osso, e, por momentos,
quase me apeteceu que tivesses deixado a tua marca;
subtil como a estrela que cubro com T-shirts,
a memória da chuva, os teus passos, de cabeça baixa,
ao longo de Division Street, cada semana mais lento,
parado junto aos bares, com janelas tão baças,
que só nos vemos a nós reflectidos nelas.
De The Shape of Every Box(2007)
* Uma rua de Sheffield, de onde a autora é originária. Possivelmente, também, um (óbvio) jogo de palavras.
Via Agio — Cadernos de ideias, textos e imagens é o resultado da junção de duas revistas literárias: a Agio e a Ítaca.
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